Estado de São Paulo
Data: 2 de maio de 2006
Cardiologistas têm dúvidas básicas sobre sua
especialidade
Médicos enviaram perguntas para um congresso; algumas foram
consideradas simplistas
Adriana Dias Lopes
Como deve ser a orientação de restrição de água
e sal para pacientes com insuficiência cardíaca? Suplementos
nutricionais, aminoácidos e isotônicos devem ser proibidos em atividades
esportivas? Posso liberar um paciente cardíaco para participar de uma
maratona? Essas são algumas das dúvidas que serão apresentadas no 27º
Congresso da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp),
de 25 a 27 de maio em Campos do Jordão. De quem são as perguntas? Dos
próprios cardiologistas.
O nível de simplicidade pode impressionar pacientes que, embora não
saibam as respostas, imaginam que seus médicos deveriam conhecê-las de
cor e salteado. Mas não choca o presidente do congresso, Fábio Sândoli
de Brito. "Há oito anos participo dessas mesas de discussão. As
perguntas sempre foram parecidas", diz ele.
Graças ao contato direto com a inexperiência clínica de alguns
colegas, Sândoli decidiu criar uma sessão de perguntas e respostas
pré-programadas nos congressos da Socesp. A de maio será a primeira. Em
poucos meses, o médico recebeu cerca de cem perguntas, enviadas
principalmente por cardiologistas do interior do Estado, de Minas, Goiás
e Mato Grosso. Algumas são complexas. Boa parte, porém, diz respeito a
questões básicas, como as já citadas (veja exemplos abaixo).
O cardiologista Carlos Serrano, do Hospital Albert Einstein, do
Instituto do Coração (Incor) e diretor de comunicação da Sociedade
Brasileira de Cardiologia, teve acesso às dez perguntas mais simples
dos colegas e fez sua avaliação. "As questões são muito simples e
mostram que há um desnível em relação aos profissionais dos grandes
centros", diz. "Certamente, eles não têm fácil acesso às informações. O
congresso vai cumprir essa função com a sessão didática."
As respostas estão sendo elaboradas por uma equipe. Cada uma deverá
durar, no máximo, três minutos. "Estou seguro de que essa sessão será
bem mais disputada do que os debates científicos", avalia Sândoli.
A simplicidade das questões levanta discussão sobre a formação
médica, principalmente a dos especialistas. "Falta educação continuada
de qualidade para os médicos que estão fora dos institutos de pesquisa",
avalia Sândoli. José Luiz do Amaral, presidente da Associação Médica
Brasileira (AMB), complementa: "A cardiologia brasileira é reconhecida
internacionalmente. O que está faltando é uma estratégia que coloque o
médico de ponta em contato com doentes e profissionais de regiões mais
distantes".
RECICLAGEM FORÇADA
O cardiologista Fábio Jatene, do Incor, pondera: "A desinformação
é cada vez mais comum em todas as áreas médicas e no mundo todo". "A
cada quatro anos, metade do conhecimento médico se torna descartável por
conta da velocidade das informações. Em países como Inglaterra e
Holanda, há muito tempo o especialista tem que revalidar o certificado
de especialista a cada cinco anos."
No Brasil, o Conselho Federal de Medicina instituiu no ano passado a
revalidação dos títulos para os médicos das 52 especialidades no País.
Eles têm cinco anos para atingir cem pontos em atividades de educação
continuada, como jornadas científicas, publicação de artigos e
participação em congressos. Quem não pontuar será submetido a uma prova
elaborada pela sociedade médica de sua especialidade. Os reprovados
perderão o certificado de especialista.