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Pedro Marques da Silva, Carlos Aguiar
A. Efeitos musculares (miotoxicidade)
O espectro clínico dos efeitos musculares das estatinas é variado e hetero-
géneo (desde a simples mialgia ou da subida assintomática da CK até à rabdomió-
lise, potencialmente fatal). Todas as estatinas podem causar dores musculares,
miopatia e rabdomiólise, mas, em muitos dos casos que ocorrem durante o tra-
tamento, não há qualquer relação com a medicação. Na sua abordagem há que
estar atento a possíveis fatores predisponentes (e.g. hipotiroidismo, défice de
vitamina D) e a potenciais DDI
48
.
A causa da miotoxicidade (e da rabdomiólise) relacionada com as estatinas
não está ainda esclarecida, tendo sido atribuída a deficiências dos compostos da
via do mevalonato: redução do colesterol e perturbação do rácio colesterol/fos-
folípidos e alteração da fluidez e comportamento funcional da membrana muscu-
lar; défice de ubiquinona (coenzima Q10) e perturbação da fosforilação oxidativa
mitocondrial; alteração da prenilação de proteínas (Ras, RhoA e B), e da trans-
dução de sinal intracelular; e indução da apoptose com inibição da proliferação
da célula muscular esquelética
48, 51-53
. A sua ocorrência não guarda relação com a
redução percentual ou absoluta do LDL-C, nem com o LDL-C alcançado.
Um número substancial de doentes com miopatia grave arrolada às estatinas
têm algum defeito metabólico muscular que o antidislipidémico põe a descoberto
(e.g. deficiências da carnitina palmitil transferase 2 ou da mioadenilato desaminase
ou doença de McArdle). O risco de miopatia é extremamente baixo (habitual-
mente inferior a 0,01%). Globalmente, a terapêutica intensiva redutora do coles-
terol pode, previsivelmente, condicionar um incremento, discreto, na ocorrência
de miopatia e um risco tendencialmente maior de elevação da CK
48
. O aumento
de risco absoluto de CK
≥
10 x LSN é de 0,7% e o de rabdomiólise é idêntico ao
arrolado à terapêutica habitual antidislipidémicas.
O perfil de efeitos adversos das estatinas pode, no entanto, variar e depen-
der das características físico-químicas de cada molécula e das suas características
farmacocinéticas. O risco de miopatia, por exemplo, pode variar com a lipofilia
da molécula e proceder de diferenças na biodisponibilidade sistémica (largamente
influenciado pela eliminação renal e pela maior ou menor possibilidade de DDI
48
).
A monitorização da creatinina quinase (CK) não ajuda a rastrear (ou a diagnosti-
car) eventuais casos de miopatia. A determinação basal e periódica da CK deve ser